ANO III - NÚMERO 5 - BOLETIM DE MAIO/23

LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL 

            REGISTROS DE OCORRÊNCIAS EM MAIO/23 

Destaques: Jornalistas sofrem agressões físicas e verbais em GO e DF. Justiça condena ex-presidente e blogueiro. Abert denuncia mais de uma centena de atentados à imprensa em 2022. STF suspende censura prévia a programa da TV Globo. Clube de futebol “barra” setorista na PB.

CENTRO-OESTE

Brasília (DF) – A jornalista Delis Ortiz, da Rede Globo, e outros profissionais não identificados foram empurrados e agredidos por seguranças que protegiam o presidente Nicolás Maduro, da Venezuela, ao término do encontro da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) na noite de 30 de maio, no Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores. Um segurança também atingiu Ortiz com um soco no peito. A confusão que culminou nas agressões de jornalistas ocorreu no momento em que o político venezuelano encerrava entrevista coletiva ao lado de presidente da República.

Catalão (GO) – Os jornalistas Mamede Leão, Ricardo Nogueira e Yan Victor, da rádio Sucesso FM, foram agredidos em 20 de maio por um homem que invadiu o estúdio da emissora durante a transmissão ao vivo de um programa. De acordo com uma das vítimas, o agressor teria se incomodado com críticas feitas pelos profissionais ao irmão dele, que é servidor da prefeitura local, e que teria se envolvido em uma confusão com outros jornalistas em um estádio de futebol da cidade em 19 de maio. Foi registrado boletim de ocorrência e a emissora lamentou o ocorrido.

Rio Verde (GO) – O jornalista, escritor e roteirista de cinema, Marçal Aquino, teve o seu romance “Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios” retirado da lista de leituras recomendadas para o vestibular da Universidade de Rio Verde (UniRV), no sudoeste de Goiás, após um deputado criticar a obra. O livro foi lançado em 2005, está em sua 23ª edição, já foi adaptado para o cinema e originou dois curtas-metragens, além de ter sido traduzido para oito idiomas. Vencedor do Prêmio Jabuti e teve obras lançadas na Alemanha, Espanha, França, México, Portugal e Suíça.A censura ocorreu após uma crítica do deputado Gustavo Gayer (PL) que, em suas redes sociais, escreveu que o livro tem “absurdos pornográficos”. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais (SJSP) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) repudiaram a censura e a atitude da Universidade.

Brasília (DF) - O jornalista Humberto Azevedo, da Agência Congresso, foi agredido verbalmente pelo deputado Gilvan da Federal (PL-ES), por ter noticiado a contratação pelo parlamentar de uma filha do senador Magno Malta (PL-ES). O deputado, ao ser interpelado pelo repórter sobre outro assunto, num dos corredores da Câmara, partiu para o xingamento, atacando a honra do profissional e o ameaçando, enquanto gravava a conversa com seu celular. O parlamentar também se recusou a responder sobre outro projeto de lei e disse que processaria o repórter se ele falasse ‘inverdades’. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF (SJPDF) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) prestaram solidariedade a Azevedo.

Brasília (DF) - A Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) divulgou seu Relatório sobre Violações à Liberdade de Expressão de 2022, onde registra dois assassinatos e 137 casos de violência não letal no ano passado.


As ocorrências envolveram pelo menos 212 profissionais e veículos de comunicação. O documento, elaborado em parceria com Unesco, Aner, ANJ e Instituto Palavra Aberta, aponta que houve uma redução de 5,52% no número de casos não letais e de 7,83% no número de vítimas em relação a 2021. No entanto, as agressões físicas estiveram no topo da lista de violações ao trabalho jornalístico em 2022, com um aumento significativo de 38,24% em relação ao ano anterior. Também houve aumento nos casos de importunação sexual, censura e ataques e vandalismos. O documento completo está disponível em https://www.abert.org.br
 

Brasília (DF) – O jornalista Guga Noblat foi xingado pelo deputado federal Mário Frias (PL-SP) em 11 de maio durante sessão da Comissão de Comunicação da Câmara dos Deputados. Sem que o profissional lhe dirigisse a palavra, o deputado se levantou e foi até Noblat, proferindo ofensas. Assim que o repórter pegou o celular para filmar o ocorrido, o deputado tomou o equipamento de sua mão. Em seguida, ameaçou tirá-lo da sessão, mas acabou deixando o recinto. A Abraji se solidarizou com Noblat e repudiou a atitude do deputado, pedindo que o caso seja analisado pelo Conselho de Ética da Câmara. 

SUL

Nova Santa Rita (RS) – A Câmara Municipal arquivou em 28 de maio o processo de cassação do vereador Eliel Alves (PRTB), acusado de agressão ao cinegrafista Jocemar Silva, da RDC TV. A acusação de quebra de decoro parlamentar foi votada em plenário, mas não obteve os oito votos necessários para a cassação – o resultado foi sete a quatro. Eliel havia dado um soco no profissional em 3 de janeiro deste ano para impedir a cobertura da movimentação de apoiadores do ex-presidente da República nos arredores do Comando Militar do Sul. Na ocasião, trajado em roupas militares, o vereador, que é líder comunitário, acertou o rosto do cinegrafista e derrubou sua câmera. O processo foi aberto em fevereiro e teve uma comissão processante que apresentou relatório aos demais vereadores. A defesa de Eliel alegou que o vereador foi provocado e ofendido pelo jornalista – o que Jocemar nega.

NORDESTE

João Pessoa (PB) - O repórter esportivo Fábio Hermano, da rádio CBN, foi “barrado” em 22 de maio pela direção do clube Botafogo –PB, sendo impedido de fazer a cobertura diária das atividades do time de futebol. Em comunicado enviado à Rede Paraíba de Comunicação, o Botafogo-PB alegou que o ato buscava preservar a “boa relação com a imprensa e seus profissionais”, afirmando que existem “rusgas pessoais” entre o profissional e o time da capital.


Na partida contra o Pouso Alegre, de MG, em 20 de maio, no estádio Almeidão, o repórter foi impedido pelo vice-presidente de futebol do clube, Afonso Guedes, de fazer uma foto do goleiro Mota, que havia sentido uma lesão durante o aquecimento e consequentemente não disputaria a partida. O dirigente impediu a foto afirmando que a informação “traria vantagem para o adversário”. Na nota, o clube narra uma situação diferente e diz que o repórter “concluiu por vontade própria e por interpretação totalmente pessoal que foi ‘intimado'”. Entidades de classe criticaram a atitude dos dirigentes.

JUDICIAIS

São Paulo (SP) – O ex-presidente Jair Bolsonaro terá de pagar R$ 50 mil em indenização por dano moral coletivo em razão de ação civil pública ajuizada em 2021 pelo Sindicato de Jornalistas de SP que exigia fim das ofensas e condenava falas misóginas e homofóbicas. A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de SP (TJ-SP) confirmou a sentença proferida pela 24ª Vara Cível de SP em junho de 2022, mas reduziu pela metade o valor da compensação, que será revertida para o Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos. O sindicato ingressou com o processo para que o mandatário parasse de ofender, deslegitimar ou desqualificar a profissão de jornalista ou profissionais da imprensa e de vazar ou divulgar dados pessoais destes.

São Paulo (SP) – Os jornalistas Tatiana Dias e Gilberto Nascimento, do The Intercept Brasil, foram intimados a depor na polícia, num inquérito aberto a pedido da Igreja Universal do Reino de Deus. O caso ocorreu após a publicação de reportagem sobre possível operação de lavagem de dinheiro pela cúpula da instituição religiosa, que teria movimentado, em cinco anos mais de R$ 33 bilhões. O Ministério Público estadual pretende descobrir quem forneceu os documentos usados na reportagem. "Isso vai contra nosso direito constitucional de manter o sigilo das fontes", protestou Tatiana. Durante o depoimento ela e Nascimento mantiveram-se em silêncio diante do delegado. 

Salvador (BA) – A jornalista Jéssica Senra, da TV Bahia, se livrou de um pedido de indenização por dano moral ajuizado por um subtenente da Polícia Militar (PM). A 4ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça (TJ-BA) manteve em 15 de maio a sentença da 5ª Vara do Sistema de Juizados Especiais de Causas Comuns de Salvador, rejeitando o processo contra a profissional de imprensa devido a um comentário feito por ela na edição de 6 de fevereiro de 2020 do telejornal Bahia Meio Dia, transmitido pela emissora afiliada à Rede Globo. Após reportagem denunciando racismo da PM contra um adolescente negro, em Salvador, Jéssica, no papel de apresentadora da atração, comparou os policiais militares a “capitães do mato”. Como houve repercussão nacional, o policial pedia indenização de mais de R$ 40 mil, além de retratação pública da jornalista. Porém, Mary Coelho, juíza relatora do caso, negou a solicitação, alegando que a jornalista não se excedeu e que, sem ofender os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, os meios de comunicação têm liberdade para criticar as instituições públicas. A magistrada também alegou que a crítica não foi direcionada ao subtenente. E sim à corporação como um todo. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), na ocasião, chegou a classificar as declarações, em suas redes sociais, como “alucinações de reporterzinha lacradora da Globo”.

Brasília (DF) - O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu decisão judicial que havia proibido a exibição do programa “Linha Direta”, da TV Globo, na noite de18 de maio, sobre a morte do menino Henry Borel, ocorrida em 2021. Ele concedeu liminar em ação movida pela Globo contra decisão da 2ª Vara Criminal do RJ que entendeu que a exibição seria “precipitada” e “contrária ao interesse público”, pois o julgamento dos acusados da morte, a mãe, Monique Medeiros, e o então vereador e namorado da mãe, Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho, ainda não ocorreu.


Na sua avaliação, já que os dois serão julgados pelo Tribunal de Júri, a exposição do caso poderá colocar em risco a imparcialidade dos julgadores. Segundo Gilmar Mendes, o ato da Justiça fluminense ofendeu o decidido pelo STF no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, que proibiu a censura prévia à atividade jornalística. A Corte assentou, ainda, que a proibição da censura não impede o controle posterior, pelo Judiciário, de excessos eventualmente cometidos pelos veículos de comunicação, com a finalidade de mitigar danos causados a direitos constitucionais de igual relevância, como a inviolabilidade da vida privada e da honra dos indivíduos.

São Paulo (SP)  – O Ministério Público estadual pediu o arquivamento da investigação — ainda em andamento — contra cinco suspeitos de agredir dois repórteres do jornal O Estado de S.Paulo que trabalhavam na cobertura da destruição causada por uma chuva intensa em São Sebastião (SP), em fevereiro, e que resultou em 65 mortes. A polícia apura a prática dos delitos de vias de fato, constrangimento ilegal, ameaça e injúria. Na ocasião, a repórter Renata Cafardo e o fotógrafo Tiago Queiroz cobriam os efeitos da chuva no litoral norte paulista e entrevistavam alguns moradores de um condomínio, quando foram abordados por outras pessoas que também viviam no local. Após se identificar e revelar o veículo para o qual trabalhava, a repórter foi chamada de "sua merda" e "comunista". Os moradores também classificaram o veículo como um "jornal de merda". Algumas pessoas atacaram Queiroz e tentaram tirar dele sua câmera. Uma delas também empurrou Renata, que caiu no chão alagado. Em sua manifestação, o promotor Marcelo Ramos, da 3ª Promotoria de Justiça de São Sebastião, afirmou que a conduta dos moradores ocorreu porque os jornalistas se negaram a apagar as imagens registradas e insistiram em permanecer no local. Para ele, os jornalistas invadiram o condomínio sem a autorização dos moradores. Mas Renata afirma que ficou na calçada em frente ao local. Já Queiroz foi o único a entrar, após pedir autorização a dois funcionários. O arquivamento diz respeito aos delitos de vias de fato, constrangimento ilegal e ameaça. Com relação ao crime de injúria, o promotor destacou que sua prática depende de manifestação da vontade da vítima e que o MP não pode agir por conta própria. 

São Paulo (SP) – O jornalista Paulo Cezar Prado, do Blog do Paulinho, é o sétimo profissional a ser acolhido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) no seu Programa de Proteção Legal, em que é fornecido apoio jurídico aos profissionais atacados no exercício da função. O programa abrange o caso em que Prado é processado criminalmente pelo desembargador Miguel Marques, conselheiro do Corinthians e magistrado designado junto ao Juizado Especial do Torcedor, órgão especializado em julgar conflitos em jogos esportivos, principalmente de futebol. São duas ações: uma interpelação criminal, que pede explicações sobre a publicação de duas reportagens, e uma queixa-crime, que pede a responsabilização pela suposta prática de crimes de calúnia, injúria e desinformação pela publicação das mesmas matérias. Paulinho já foi AL vo de ações criminais em outros episódios lhe atribuindo a prática de difamação e outras ofensas à honra, chegando a ser preso.

São Paulo (SP) - Sem recurso apresentado contra decisão tomada em dezembro do  ano passado, a ação judicial da jornalista Patrícia Campos Mello, do jornal Folha de S. Paulo, contra o fundador do site Terça Livre, o blogueiro Allan dos Santos, foi encerrada. Ele deverá pagar R$ 35 mil em indenização por danos causados à profissional. Em dezembro de 2022, a 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça (TJ-SP) condenou Santos por uma série de ofensas contra Campos Mello. A defesa dele poderia ter recorrido da decisão, o que não aconteceu. O trânsito em julgado ocorreu após certificação em cartório sobre o fim do prazo para recurso, que poderia ter sido apresentado até 18 de maio.


Relator do caso, o desembargador Costa Netto disse, durante o julgamento, que as expressões de cunho sexual usadas por Allan dos Santos não estão protegidas pelo direito à liberdade de expressão. O magistrado afirmou que o blogueiro extrapolou o caráter meramente crítico e de manifestação de opinião e expôs Campos Mello a todo tipo de constrangimento.

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 Fontes: ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), ARI (www.ari.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas & Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),  https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa), Sociedade Interamericana de Imprensa (https://pt.sipiapa.org/), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (https://cpj.org/pt/), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu) e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)

vilsonromero@yahoo.com.br

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