ANO III - NÚMERO 11 - BOLETIM DE NOVEMBRO/23

 LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL 

BOLETINS DE OCORRÊNCIAS EM NOVEMBRO/2023

Destaques: STF decide responsabilizar veículos de comunicação por declarações de entrevistados. CNDH aprova resolução sobre liberdade de imprensa e trabalho jornalístico. Justiça de SC condena profissional a prisão por matéria sobre influenciadora. Jornalista sofre assédio judicial de confederação israelita em SP. CPJ classifica Brasil em 10º. lugar no ranking da impunidade dos crimes contra a imprensa.

JUDICIAIS

Brasília (DF) - O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em 29 de novembro a possibilidade de responsabilização civil de veículos de comunicação por declarações de entrevistados que imputem de forma falsa crime a terceiros. A tese do ministro Alexandre de Moraes, com mudanças propostas por Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, estabelece que a responsabilização pode incluir remoção de conteúdo e responsabilização civil da empresa jornalística que publicar uma entrevista com "informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas".

"Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios", diz a tese do STF. O caso julgado decorre de uma ação ajuizada pelo ex-deputado federal Ricardo Zarattini, já falecido, contra o Diário de Pernambuco. Zarattini processou o jornal devido a uma entrevista de 1995, na qual o delegado Wandenkolk Wanderley afirmou que o ex-parlamentar foi o mentor de um atentado a bomba ocorrido em 1966 no aeroporto de Guararapes (Recife).

 

São Paulo (SP)  - O jornalista Breno Altman, do portal Ópera Mundi, foi censurado pelo juiz Paulo Baccarat, da 16ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de SP, que determinou a retirada das redes sociais do profissional de posts alegadamente antissemitas e, portanto, racistas. A ação foi movida pela Confederação Israelita do Brasil (Conib), questionando a posição de Altman a favor do povo palestino e de denúncia às práticas genocidas realizadas pelo governo de Israel contra a população da faixa de Gaza. A Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e dos Direitos Humanos da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), em 23 de novembro, lamentou que o juiz tenha cedido à pressão da Conib e pediu ao magistrado que reconsidere seu posicionamento, evitando assim “atacar a liberdade de expressão que ele próprio diz prestigiar”.

Florianópolis (SC) - A jornalista Schirlei Alves, autora de reportagens sobre o caso da influenciadora Mariana Ferrer, publicadas no site Intercept Brasil, foi condenada a um ano de prisão em regime aberto pela juíza Andrea Studer, da 5ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis.

A profissional também deve pagar R$ 200 mil de reparação ao juiz Rudson Marcos e a mesma quantia ao promotor Thiago Carriço. A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e mais de 50 organizações e personalidades assinaram um manifesto em defesa da profissional. Em reportagem publicada em 2020 pelo Intercept Brasil, Alves revelou o constrangimento, a humilhação e a violência praticados contra Ferrer enquanto ela prestava depoimento como vítima, no julgamento contra o homem acusado de estuprá-la em 2018. Para a rede Voces del Sur, a condenação é ultrajante e ataca a liberdade de imprensa e de expressão. Os processos correram em sigilo na Justiça de SC. As sentenças, publicadas em 27 de setembro, foram obtidas pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Vilhena (RO) - O jornalista Mario Quevedo Neto está sendo alvo de tentativa de cerceamento de seu trabalho profissional e do direito de opinião por parte do prefeito Delegado Flori (Podemos) que fez denúncia à justiça, pedindo abertura de inquérito policial criminal. Quevedo vem publicando notícias contra atos do prefeito, como o do professorado e o da privatização da saúde municipal, entre outros, e foi acusado pelo delegado de realizar “perseguição”, “destilar ódio”, promover “cruzada de maldades”, possuir ilegítimos “interesses particulares e políticos”, não lhe dar oportunidade, no conteúdo noticioso, de “defender-se” e “não querer ouvir/saber” sua versão dos fatos. A Associação Rondoniense de Jornalismo Digital (Arjore) manifestou apoio ao jornalista e repudiou o assédio judicial por parte do político.

São Paulo (SP)  - O comentarista esportivo Mauro Cezar Pereira, da Jovem Pan, se livrou de indenizar por danos morais o técnico Abel Ferreira, da equipe masculina de futebol da Sociedade Esportiva Palmeiras. Em julho de 2022, durante entrevista coletiva, Abel Ferreira comentou a mentalidade e a formação de atletas brasileiros, e disse que eles tinham “muito que evoluir em nível de educação, em nível de formação enquanto homens. Eles não têm essa formação. Eles, às vezes, não têm noção do que estão a fazer, não tem noção nenhuma e apostar na formação é isto”. Sobre o comentário de Ferreira, Mauro disse que as declarações do técnico do Palmeiras eram “papo de colonizador”. Abel ingressou com a ação pedindo indenização de R$ 50 mil por entender que as falas do jornalista foram injuriosas e xenófobas. A juíza Renata Carvalho, da 17ª Vara Cível do TJ-SP, entendeu que Mauro Cezar não cometeu nenhum ato ilícito e que “uma das finalidades da liberdade de expressão é a crítica”. Abel terá que pagar R$ 10 mil em honorários aos advogados de Mauro e da Jovem Pan. O técnico declarou que vai recorrer da decisão.

SUL

Porto Alegre (RS) – O repórter Everton Leitte, da web rádio Pachola, registrou boletim de ocorrência por agressões sofridas de funcionários do Sport Club Corinthians Paulista. O profissional alega que foi atacado quando gravava imagens de uma confusão ocorrida no intervalo da partida entre Grêmio e Corinthians, em 12 de novembro, na Arena do Grêmio. Insatisfeitos com a atuação da arbitragem, funcionários do Corinthians tentaram invadir a cabine do VAR.

Em vídeo divulgado nas redes sociais da rádio Patchola é possível ver um deles bater na porta do local e gritar para que abrissem. Quando percebe que está sendo filmado, o corintiano vai para cima do repórter e grita "Tirem esse cara daqui". Neste momento, o celular de Everton Leitte é atingido. A confusão também foi flagrada por uma equipe da RDC TV. A Patchola é setorista do time gremista.

CENTRO-OESTE

Cuiabá (MT) - A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas de MT (Sindjor/MT) pediram à Procuradoria Geral da República (PGR) o afastamento do governador Mauro Mendes (União) e a decretação de intervenção federal no estado. Segundo as entidades, Mauro Mendes tem promovido ataques ao livre exercício do jornalismo e perseguido profissionais de imprensa. Elas também solicitam a “investigação e eventual responsabilidade” do governador após a apuração dos fatos denunciados pelas autoridades. O documento protocolado em 16 de novembro informa que 15 jornalistas foram alvos de ações da Polícia Civil de MT em 2022, devido a reportagens envolvendo o gestor e seus familiares.


Brasília (DF) – A jornalista Andreza Matais, editora de política e diretora da sucursal do jornal O Estado de S.Paulo, foi vítima de uma série de ataques promovidos por apoiadores do atual governo. Em outubro, ela teve invadida a sua conta no Gov.BR, portal do governo federal que reúne serviços para cidadãos. Golpistas trocaram a senha de acesso da jornalista e exigiram dinheiro para não divulgar dados de seu Imposto de Renda. Antes da invasão, a jornalista foi atacada nas redes sociais por divulgar, em 4 de outubro, uma reportagem com o título “Lula atuou em operação para banco emprestar US$ 1 bilhão à Argentina e barrar avanço de Javier Milei”. Em novembro, houve novas “tentativas de intimidação” contra o jornal e a editora, após matéria sobre a participação de esposa do líder do tráfico amazonense em encontros do Ministério da Justiça e Segurança Pública. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) repudiou a onda de ataques que "demonstra um flagrante desrespeito à liberdade de imprensa”.


Brasília (DF)  - O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos, aprovou em 10 de novembro, durante a sua 74ª Reunião Ordinária, a Resolução n°. 16 que “dispõe sobre as garantias individuais e coletivas para o pleno exercício da liberdade de imprensa e da profissão de jornalista no País”. O documento considera o cenário de ataques aos profissionais da categoria, as demissões em massa de jornalistas e radialistas de grandes grupos de mídia, a desvalorização profissional, a demissão de dirigentes sindicais, entre outras situações, como assédio e banalização da violência. O CNDH define, no documento, o que é a violência contra o exercício profissional de jornalistas e profissionais de imprensa, o que inclui impedir ou dificultar a atuação profissional, assediar, utilizar-se de violência digital, cercear a atividade profissional.
Configura violência também agressões verbais ou ameaças a profissionais no exercício de sua função, ofensas à integridade corporal ou a saúde de profissionais, ataque a veículos de comunicação e a jornalistas de forma genérica e ainda ataques ao direito à livre organização dos trabalhadores da mídia. A resolução afirma que o Estado e as empresas têm o dever de garantir aos profissionais que atuam na produção de informação sua liberdade de exercício e integridade física e moral. Às empresas privadas de jornalismo, cabe, de acordo com a resolução, monitorar casos de condutas violentas contra jornalistas, apoiar e investigar casos de violência contra profissionais, respeitar os processos coletivos, as associações, entidades sindicais, organizações, movimentos e outras formas de representação próprias da categoria. O documento expressa que todo jornalista e profissional da imprensa é livre para exercer sua atividade, tendo como direitos fundamentais a liberdade de criação e de expressão, o acesso a fontes de informação, a garantia do sigilo de suas fontes, bem como o sigilo de seu material de trabalho. Também é configurado como direito fundamental a propriedade do seu material de trabalho, o livre trânsito em locais públicos ou abertos ao público para o exercício da atividade jornalística. O documento também busca garantir que não deve haver censura prévia.
 
Iguatemi (MS) – O fotógrafo canadense Renaud Philippe, sua mulher, a cineasta e antropóloga Ana Carolina Porto, e o engenheiro florestal Renato Galata foram agredidos por homens armados e encapuzados no entroncamento da rodovia MS-295. Os três estavam no município de Caarapó quando foram avisados de tentativa de ocupação na cidade vizinha, Iguatemi, nas fazendas Maringá, Cachoeira e Santa Rita. Antes de chegarem ao local, foram parados por homens, que seriam seguranças e fazendeiros que fecharam a rodovia com cerca de 30 caminhonetes. A equipe de documentaristas foi alvo de chutes e socos e teve o equipamento de filmagem roubado. Phillippe foi o principal alvo e, além das agressões, teve parte do cabelo cortado a faca. Galata é integrante do PCO (Partido da Causa Operária), baseado em Dourados, e estava acompanhando o casal que faz documentário sobre as ações dos guarani-kaiowá pela posse de terras. Ninguém foi preso e a Polícia Federal (PF) investiga o ocorrido. A Abraji e outras entidades manifestaram solidariedade aos profissionais agredidos e reafirmaram o compromisso com a defesa dos direitos dos povos indígenas.
Brasília (DF) – O Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ) anunciou que o Brasil ocupa o 10º lugar na lista de países que pouco solucionaram e puniram crimes contra a vida de trabalhadores da imprensa nos últimos dez anos. O Índice de Impunidade Global 2023, lançado em 2 de novembro, Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas, contabiliza 11 mortes entre setembro de 2013 e agosto de 2023. Todos os casos permanecem impunes. Outros dois países latino-americanos – Haiti e México – aparecem no top 10 do ranking. Os dados denunciam que, dos 261 assassinatos conectados ao trabalho jornalístico nos últimos 10 anos ao redor do mundo, 204 não tiveram nenhuma solução.

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Fontes: ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa (www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas & Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),  https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa) e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)

vilsonromero@yahoo.com.br


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