ANO IV - NÚMERO 5 - BOLETIM DE MAIO/24
LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL
BOLETINS DE OCORRÊNCIAS EM MAIO/24
Destaques: STF reconhece como assédio o ajuizamento de ações em série contra a imprensa e comunicadores. Colunista de ZH é condenado a indenizar advogada por comentário difamatório. Entidades criam coalizão nacional em defesa do jornalismo.
CENTRO-OESTE
Brasília (DF) – A Coalizão em Defesa do Jornalismo, integrada por dez organizações de liberdade de imprensa, foi lançada em 6 de maio, durante sessão do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional (CCS). As entidades já atuam em conjunto em temas de defesa da imprensa e dos jornalistas nos últimos dois anos, quando a liberdade de imprensa esteve sob forte ataque. Integram o colegiado: Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Artigo 19, Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ), Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj), Instituto Palavra Aberta, Instituto Vladimir Herzog, Instituto Tornavoz, Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca) e Repórteres Sem Fronteiras).
SUDESTE
São Paulo (SP) - O estudo “Ataques relacionados a gênero e desinformação” foi lançado em 1º. de maio, durante reunião paralela ao encontro do G20 sobre integridade da informação. Feito pela organização #ShePersisted, em parceria com a empresa de análise de dados The Nerve, da jornalista filipina Maria Ressa, vencedora do prêmio Nobel da Paz por sua defesa da liberdade de imprensa, o trabalho, cujo lançamento contou com presença de Ressa, analisou mais de 1,15 milhão de publicações e comentários ofensivos contra jornalistas mulheres e políticas brasileiras veiculados, entre 2019 e 2024, no X (ex-Twitter), Facebook e YouTube. Além de demonstrar que os ataques on-line frequentemente miram a credibilidade, inteligência e reputação das vítimas, o trabalho indica que tais publicações ofensivas muitas vezes são compartilhadas em páginas da extrema direita nacional.
Entre as mulheres mencionadas nas publicações estão as jornalistas Daniela Lima, hoje na GloboNews, Amanda Klein, da Rede TV! e Jovem Pan, Vera Magalhães, da TV Cultura e O Globo, Miriam Leitão, da GloboNews, e Mônica Bergamo, da Folha de São Paulo, além de inúmeras parlamentares.São Paulo (SP) - A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e a Fundação para a Liberdade de Imprensa (Flip), da Colômbia, produziram um relatório, em duas seções, sobre os desafios do jornalismo nas Amazônias brasileira e colombiana, onde muitos líderes ambientais foram assassinados nos últimos anos. O último relatório da Global Witness, publicado em 2023, denuncia que, dos 177 assassinatos em todo o mundo em 2022, 60 ocorreram na Colômbia e 34 no Brasil. Cerca de 36%, 64 pessoas, pertenciam a comunidades indígenas. O relatório examina as condições que afetam o direito às liberdades de imprensa e de expressão, com foco no jornalismo e em outras formas de produção de informações de interesse público.
SUL
Porto Alegre (RS) - A equipe do repórter Eduardo Paganella, da RBS TV, foi hostilizada durante uma entrada ao vivo no programa “Jornal do Almoço”, em 11 de maio, inclusive interrompendo a transmissão da matéria. Durante uma reportagem sobre voluntários que criaram um abrigo para animais resgatados das enchentes, em Canoas, a equipe foi vaiada e expulsa, por conta de protestos contra a Rede Globo, ao mostrar o trabalho feito pelas pessoas. Paganella elogiou a iniciativa dos voluntários e convidou um dos organizadores do galpão para uma entrevista. Enquanto era descrita a rotina das pessoas no local, um grupo começou a gritar “Globo lixo”, porém, o repórter ignorou e continuou a transmitir as informações.
A câmera mudou o quadro para mostrar os cães que estavam recebendo cuidados dos voluntários, quando um homem entoou o coro, e mulheres mostraram o dedo médio em represália à reportagem. Evitando mais hostilidades, a equipe deixou o galpão. O presidente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), José Nunes, lamentou os ataques que os profissionais da imprensa estão sofrendo e solicitou apoio dos órgãos de segurança na defesa do trabalho jornalístico.JUDICIAIS
Brasília (DF) – Os assassinos do jornalista esportivo e radialista Valério Luiz tiveram suas condenações confirmadas pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 21 de maio. O crime ocorreu em 5 de julho de 2012, em Goiânia, e o empresário e dirigente de futebol Maurício Sampaio, condenado como mandante do crime, tentava a anulação do julgamento. O STJ rejeitou o recurso de Sampaio e confirmou a validade do julgamento, que ocorreu em 2022, dez anos depois do assassinato. Até agora, os condenados não estão presos. Se o recurso da defesa fosse aceito pelo STJ, o processo do caso seria anulado e a investigação recomeçaria do zero. Com a decisão, fica mantida a sentença dos condenados: Urbano de Carvalho Malta, acusado de contratar o autor dos disparos; Ademá Figueredo Aguiar Filho, policial militar contratado para a execução; Marcus Vinícius Pereira Xavier, condenado por auxiliar no planejamento do homicídio, e Maurício Sampaio, mandante do crime. Valério Luiz foi morto a tiros, aos 49 anos, quando saía da rádio em que trabalhava. Segundo o Ministério Público, o assassinato foi motivado pelas críticas do radialista ao Atlético-GO, time do qual Maurício era vice-presidente.
Brasília (DF) - O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em 22 de maio, reconheceu como assédio judicial o ajuizamento de inúmeras ações simultâneas sobre os mesmos fatos, em locais diferentes, para constranger jornalistas ou órgãos de imprensa e dificultar ou encarecer a sua defesa. A decisão resultou do julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6792, da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), e 7055, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). No entendimento do colegiado, a prática é abusiva e compromete a liberdade de expressão. A maioria entendeu que só há responsabilidade civil em caso inequívoco de culpa grave.
O julgamento havia iniciado em setembro de 2023, em sessão virtual, com o voto da relatora, ministra Rosa Weber (aposentada), para a qual a fixação de indenização por dano moral a veículos de imprensa depende da comprovação da disseminação deliberada de desinformação, da manipulação de grupos vulneráveis, de ataque intencional à reputação de alguém ou da apuração negligente dos fatos. Porém, ela não conheceu (considerou inviável) do pedido de centralização das ações no domicílio do jornalista ou do órgão de imprensa, por entender que não cabe ao Poder Judiciário modificar regras processuais. Em 16 de maio, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, abriu a divergência por considerar que, quando for caracterizada a prática do assédio judicial, a parte acusada poderá pedir a reunião de todas as ações no local onde reside. Na ocasião, o ministro Cristiano Zanin acrescentou que o juiz pode extinguir a ação quando identificar que seu propósito não é uma efetiva reparação, mas apenas o assédio. Os detalhes e os votos estão no site do STF.Curitiba (PR) – A RIC TV teve seu programa “Balanço Geral” impedido judicialmente por duas semanas de levar ao ar uma reportagem da série ”Guerra de Facções” que expõe as complexidades do tráfico internacional de drogas. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais (SindijorPR) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) lamentaram e repudiaram a censura imposta. Com a pressão e repercussão do fato, o denunciante desistiu da ação judicial e o último episódio da série foi transmitido em 27 de maio.
São Paulo (SP) - O jornalista José Roberto Dias Guzzo, colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e Zero Hora, entre outros, foi condenado a quatro meses de prisão em regime aberto, substituída pelo pagamento de 23 salários mínimos, além de indenização por danos morais de R$ 10 mil por difamação à advogada Caroline Proner, esposa do cantor e compositor Chico Buarque. Proner apresentou queixa-crime após Guzzo publicar, em fevereiro de 2023, um artigo intitulado “Amigos de Lula atacam o erário com a voracidade de um cardume de piranha”, no qual menciona implicitamente Proner ao referir-se à “mulher do compositor Chico Buarque” como beneficiária de um cargo de assessoria no BNDES, insinuando que sua nomeação foi indevida e desqualificada. A advogada alegou que o artigo atacou sua reputação, imputando-lhe ações que desmereciam sua qualificação profissional e a retratavam como parte de um esquema de corrupção. Na decisão, a juíza afirmou que a linguagem utilizada por Guzzo no artigo, como “assalto geral às bocas da máquina pública”, “cardume de piranha” e “atacam o erário com voracidade”, extrapolou o direito à liberdade de expressão e atingiu diretamente a honra de Proner.
São Paulo (SP) – O Ministério Público de São Paulo (MPSP) divulgou nota de esclarecimento em 16 de maio negando que tenha pedido a condenação do jornalista Luan Araújo pelos crimes de injúria e difamação à deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). Apesar disso, em 6 de maio, o promotor Roberto Bacal deu parecer favorável à condenação do jornalista. Para ele, “desde o início do desentendimento, houve uma ofensa gratuita e dolosa contra a deputada”. “Ficou patente que, no dia em que ocorreu o desentendimento, a deputada almoçava em um restaurante com seu filho e um amigo e foi avistada pelo querelado. Sem qualquer provocação contra sua pessoa, ele se direcionou à deputada para lhe dirigir ofensas”, declarou. Bacal afirmou também que o jornalista, em texto publicado dias depois, atacou a honra de Zambelli, “com um excesso de linguagem”. No artigo, Luan disse que a deputada “segue uma seita de doentes de extrema-direita” e que “segue cometendo atrocidades atrás de atrocidades”. À Justiça, Luan Araújo disse que não cometeu crime algum com a publicação do artigo, e que apenas exerceu seu trabalho profissional, amparado pela liberdade de expressão. Sobre a discussão na véspera da eleição, o jornalista negou ter empurrado a deputada, ao contrário do que ela alega. Luan disse que xingou Zambelli ao perceber que ela pedia voto ao recepcionista de um bar, o que originou uma discussão. O processo ainda não foi julgado. O fato ocorreu em outubro de 2022, na véspera do segundo turno da eleição presidencial, quando Luan Araújo foi perseguido por Carla Zambelli após uma discussão. A parlamentar carregava uma arma na esquina da rua Joaquim Eugênio de Lima com a Alameda Lorena, no bairro dos Jardins, na zona oeste da cidade. A deputada foi denunciada pela Procuradoria-Geral da República por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo. Já Carla Zambelli abriu um processo contra o jornalista após um artigo que Luan Araújo publicou comentando o episódio. Na ação contra o jornalista, Zambelli disse que as afirmações são ofensivas e irresponsáveis.
Brasília (DF) - A revista Carta Capital se livrou de indenizar o pastor evangélico Anderson Silva que contestava textos de opinião com críticas a ele publicadas no site do veículo. A 7ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do DF entendeu que “exposição de opiniões, crenças, juízos de valor e críticas com uso de figuras de linguagem e irreverência na forma de se expressar, sem abusos ou excesso, é compatível com a liberdade de imprensa”.
Além disso, acrescenta “pessoas conhecidas publicamente estão sujeitas a críticas severas ou intensas de profissionais dos meios de comunicação social”. O autor da ação é fundador de uma confraria chamada Machonaria, que acredita na “masculinidade bíblica” como solução para “uma sociedade caída” e defende que, sem isso, “todo o ecossistema entra em desordem”. Em 2021, uma cientista social evangélica, responsável por um blog sobre religião na revista, publicou dois textos de opinião críticos ao pastor e à Machonaria. No primeiro deles, a blogueira descreveu o que chamou de “fundamentalismo com a cara do pastor” em questão: “tatuado, barba, camisa de lenhador, em defesa das armas — e que permite aquela cerveja e aquela verdinha depois do culto”. Já no segundo texto, ela se contrapôs a uma publicação feita pelo pastor nas redes sociais em que ele citava um “potencial demoníaco” das mulheres.Petrolina (PE) - O humorista e repórter independente Robério Aguiar Galdino se livrou de censura a vídeos postados em seu Instagram onde ironizava pedidos de aplausos na Câmara de Vereadores local. O ministro Gilmar Mendes, do STF, anulou decisão do 2º Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo local que havia determinado a exclusão das postagens, a pedido de um vereador. Na reclamação, o humorista alegou que a determinação violou decisões do STF contra a prática de atos estatais que configurem censura prévia à atividade jornalística. A argumentação se refere ao julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, em que a Lei de Imprensa foi considerada incompatível com a Constituição de 1988; e à análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.451, na qual dispositivos da Lei das Eleições que vedavam sátiras a candidatos foram declarados inconstitucionais. Ao examinar o caso, Gilmar Mendes entendeu que o fato de o artista criticar pessoa pública, por meio de sátiras humorísticas, não autoriza a interferência prévia do Poder Judiciário para proibir as postagens, sob pena de afronta à liberdade de expressão. O relator lembrou ainda que a Constituição proíbe, de forma expressa, a censura, e que as liberdades de informação, de imprensa e de manifestação do pensamento em geral sempre devem ser preservadas.
Campo Grande (MS) - O jornalista Edivaldo Bitencourt, editor do site O Jacaré, foi condenado a nove meses e dez dias de detenção em regime aberto, convertidos em prestação de serviços, por calúnia ao ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB). Ele também deverá pagar multa e custas do processo. A defesa deve recorrer da sentença. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais (Sindjor-MS) reprova a decisão de primeira instância em razão de reportagens sobre supostas irregularidades na gestão estadual.
Brasília (DF) – Um site de notícias foi condenado pela 4ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) a indenizar em R$ 50 mil uma menina por
danos morais devido à publicação de matéria que, ao relatar o estupro que ela
sofreu antes de completar 14 anos de idade, vinculou a narrativa a uma manchete
sensacionalista. Segundo o STJ, o site cometeu ato ilícito ao, apesar de
divulgar fato verídico, sem identificar nominalmente as pessoas envolvidas,
acrescentou à notícia ofensas à honra da vítima. O site atribuiu à menina
conduta ativa ante o fato ocorrido e levantando dúvidas morais sobre seu
comportamento. Na matéria, o site se referiu à vítima como “novinha” e insinuou
que ela havia mantido relações sexuais com o padrasto, em vez de relatar que
foi vítima de estupro, e ainda a responsabilizou por criar um suposto “barraco
familiar”.
.........
Fontes:
ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ
(www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br),
Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa
(www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa
(www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal
dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas &
Cia
(https://www.jornalistasecia.com.br/), https://mediatalks.uol.com.br,
Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa)
e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de
jornalista.
Pesquisa
e edição: Vilson Antonio Romero (RS)
vilsonromero@yahoo.com.br
Comentários
Postar um comentário